A prática de sustentabilidade e inovação na habitação popular é discutida no mundo todo. Principalmente com a aprovação da Organização das Nações Unidas (ONU) da Agenda 2030, e seus 17 Objetivos Sustentáveis. Destes, três se relacionam diretamente com a sustentabilidade e inovação na habitação popular.
Responda a pesquisa e receba um relatório final com o resultado
ONU e o compromisso com a sustentabilidade e inovação na habitação popular
Os objetivos estabelecidos pela ONU foram:
- Objetivo 6: Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos:
“Até 2030, aumentar substancialmente a eficiência do uso da água em todos os setores e assegurar retiradas sustentáveis e o abastecimento de água doce para enfrentar a escassez de água, e reduzir substancialmente o número de pessoas que sofrem com a escassez de água”
- Objetivo 7: Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos. Item 7.2:
“Até 2030, aumentar substancialmente a participação de energias renováveis na matriz energética global”
- Objetivo 9: Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação. Item 9.1:
“Desenvolver infraestrutura de qualidade, confiável, sustentável e resiliente, incluindo infraestrutura regional e transfronteiriça, para apoiar o desenvolvimento econômico e o bem-estar humano, com foco no acesso equitativo e a preços acessíveis para todos. ONU.”
Leia também: Conservação do meio ambiente: qual o papel das empresas nessa jornada?
Sustentabilidade e inovação na habitação popular na prática: como é possível fazer?
A transformação do conceito em ações práticas requer um estudo apurado das condições técnicas, como também o entendimento do conceito de sustentabilidade, para depois, aplicar-se nas habitações populares.
Quando pensamos em sustentabilidade não podemos desassociar de três fatores básicos que compõem suas esferas, como apresentado na figura abaixo:
Na relação da esfera econômica e ambiental existe a questão da viabilidade. Essa análise é composta, pelo estudo da relação entre lucro e redução de custo, em outras palavras, custo – benefício. Daí surge uma questão importante a ser discutida: Será que a implantação de sistemas que promovam a sustentabilidade em determinado projeto se sustenta financeiramente e economicamente?
Da mesma forma, na esfera ambiental, deve-se analisar a utilização dos recursos naturais e sua justificativa. Como implantar um sistema de aproveitamento de água da chuva em um local que minimamente não chove? Quando esses investimentos trarão retorno ambiental e econômico?
Então, como sugestão, nós da área técnica, podemos estruturar nossa avaliação na tipologia de projeto e em um conjunto de medidas no âmbito da engenharia ou não, com o objetivo de adequar ou implantar sistemas que promovam a sustentabilidade e inovação na habitação popular. Sendo assim, podemos classificar as edificações e medidas desta forma:
- Retrofit: Adaptação de uma estrutura a sistemas sustentáveis, como exemplo o reuso de água.
- Novas edificações: Edificações a serem construídas passíveis de introdução de sistemas de engenharia que garantam a sustentabilidade desde seu projeto.
- Medidas estruturais: Requer intervenção de engenharia. O projeto deve ser congruente com normas técnicas, como a NBR 15575 Desempenho das Edificações e NBR 15527 Aproveitamento de Água da Chuva.
- Medidas não estruturais: Não requer intervenção de engenharia. Consegue-se adaptação por costumes, comportamento e administração.
Assim será possível qualificar o processo de introdução destes sistemas e o tipo de atividade a ser realizada para a implantação e análise da viabilidade.
Leia também: Como funciona a Análise de Qualidade de Energia?
Como planejar a sustentabilidade e inovação na habitação popular
Para a implantação de sistemas de engenharia que visam a sustentabilidade em habitações populares, é preciso realizar um estudo amplo das características locais, da legislação, e do modelo construtivo dessas edificações. Verificar no mercado quais as melhores práticas e equipamentos a serem instalados, e definir a solução de acordo com critérios de custo, eficiência ambiental e facilidade de manutenção. Para tal, pode-se criar uma matriz de decisão simples, como apresentado nas imagens a seguir:
Dependendo do sistema a ser implementado, critérios como espaço, quantidade de recurso natural e posicionamento das edificações em relação ao sol, podem inviabilizar as medidas que promovam a sua sustentabilidade.
O espaço é fundamental para atividades como coleta seletiva, separação de resíduos, instalação de placas fotovoltaicas e criação de reservatório de água de chuva ou reuso.
No caso do aproveitamento da energia solar, dependendo do consumo, pode-se requerer muito espaço e maior capacidade do telhado em absorver a carga gerada por uma quantidade de placas. As placas também dependem da angulação em relação ao sol. Como na imagem abaixo:
Outra questão que deve ser levantada é a característica do recurso que se pretende explorar, no caso do aproveitamento de água de chuva, a captação depende não só da chuva, como da área de telhado e da disposição do sistema existente, por exemplo. Uma área pequena, a disposição do sistema existente pode inviabilizar o projeto.
Neste caso, o aproveitamento pode ser realizado para atender a algumas finalidades específicas, como Reserva Técnica de Incêndio -RTI, ou limpeza de áreas comuns. Abaixo a disposição de um sistema hidráulico:
Especificamente no caso de sistemas de aproveitamento de água da chuva, é preciso procurar os dados hidrológicos da região do empreendimento e estar atento com o ano hidrológico.
A implantação de sistemas de aproveitamento de recursos naturais, deve ser bem planejada, a fim de evitar falta de eficiência.
Análise da viabilidade para a implementação de edificações sustentáveis em habitações populares
Como vimos anteriormente, para definirmos se existe a viabilidade para a construção de habitações populares sustentáveis precisamos nos basear em dois pilares: financeiro/econômico e ambiental. Abaixo mostrarei como é possível verificar a viabilidade para cada um desses elementos:
Avaliação da Viabilidade Econômica/Financeira
Para a análise da viabilidade econômico-financeira e para implantação de sistemas que garantam a sustentabilidade das habitações populares, faz-se necessário subsidiar as escolhas das melhores medidas e sistemas sustentáveis aplicados dentro das edificações, por gestores, engenheiros e moradores. Antes da implantação de fato, devemos entender a relação do que vai ser investido e quais os benefícios que os sistemas trarão.
Para tal, recomendamos VP (Valor Presente), VPL (Valor Presente Líquido), TIR (Taxa Interna de Retorno), Payback Simples e o IL (Índice de Lucratividade).
O VP é necessário para analisar as estimativas de custos e as receitas são transformadas para um valor equivalente na data atual. Então, é possível considerar o efeito dos juros compostos ao longo do tempo. Assim, podemos determinar o valor atual do montante a ser investido.
𝑉𝑃=𝐹𝐶1(1+𝑖)¹+𝐹𝐶2(1+𝑖)²+𝐹𝐶3(1+𝑖)³ |
onde:
VP = Valor Presente;
FCj= fluxo de caixa previsto para o projeto em cada intervalo de tempo;
i = taxa de desconto; e
t = período (1, 2, 3…).
O VPL permite descobrir a atratividade financeira da medida, projeto, ou sistema a ser implantado. Como planejamento tem a capacidade de identificar preliminarmente a viabilidade ao longo do tempo de um determinado projeto. Este é calculado pela expressão:
𝑉𝑃𝐿=𝐹𝐶1(1+𝑖)¹+𝐹𝐶2(1+𝑖)²+𝐹𝐶3(1+𝑖)³−𝐹𝐶0 |
onde:
VPL = Valor presente líquido;
FC0= fluxo de caixa no momento zero;
FCj= fluxo de caixa previsto para o projeto em cada intervalo de tempo;
i = taxa de desconto;
t = período (1,2,3…).
A Taxa Interna de Retorno (TIR) é a taxa de atualização do projeto que dá ao VPL nulidade, calculada segundo Rego (2013) pela expressão a seguir:
VPL=0=Investimento inicialt=1n=Ft(1+TIR)^t |
onde:
VPL = valor presente líquido;
F = fluxo de caixa de cada período;
t = período em questão;
n = quantidade de períodos;
TIR = Taxa Interna de Retorno.
O Payback simples ou tempo de retorno é calculado de maneira direta, ou seja, é o número de meses ou anos necessários para recuperar um investimento feito, como apresentado na expressão:
Payback simples = Dispêndido inicialCaixa Livre |
A lucratividade do empreendimento pode ser analisada pelo IL, cuja fórmula é:
Índice de Lucratividade =VPI |
onde,
VP = valor presente;
I =Investimento;
Sinduscon (2005), analisa que o custo e o consumo de água é calculado pelo Fluxo de Benefício (B), ou seja, o valor mensal economizado de água com base nas tarifas do prestador de serviços de água local. Podemos adaptar a expressão, para calcular o custo benefício para outras análises de sistemas que promovem a sustentabilidade, como implantação de placas fotovoltaicas.
B=C1-C2 |
onde:
C1= valor médio custo antes da intervenção;
C2= valor esperado após a intervenção (implantação de sistema ou medida de sustentabilidade);
B = benefício.
Avaliação da Viabilidade Ambiental
A avaliação da viabilidade ambiental, neste caso em específico, está relacionada ao impacto das medidas de sustentabilidade X a solução de engenharia. Podemos exemplificar por um sistema de aproveitamento de água da chuva. Se houver capacidade de suporte do solo e a captação de água da chuva não alcançar níveis que justifiquem sua utilização, não há necessidade de implantação do sistema. Haveria assim, uma intervenção nos processos naturais injustificados.
Já na questão dos resíduos, devemos ficar atentos ao processo de segregação, ao espaço necessário e se compensa realizá-la. Em muitas localidades, só os resíduos recicláveis são estratificados, em outras pode-se pensar em compostagem dos orgânicos.
Então, recomenda-se um estudo feito por profissionais técnicos, para determinação dos sistemas que irão prover a sustentabilidade. Para a habitação popular, pode-se recorrer a universidades, parceiros do terceiro setor e empresas que financiem o projeto.
Manutenção dos sistemas sustentabilidade nas habitações populares
Ao implantar sistemas que visam a sustentabilidade nas edificações, deve-se atentar ao processo de manutenção, pois, as previsões orçamentárias são realizadas e aprovadas por condôminos ou moradores. Por isso, a escolha da tecnologia e processos são fundamentais para a sustentabilidade financeira do empreendimento para que o custo possa ser absorvido e torne-se viável a manutenção destes sistemas.
A manutenção consiste em um conjunto de ações que visam a continuidade em perfeito funcionamento dos sistemas ambientais das edificações de baixa renda. Em uma visão global constitui-se custos que devem ser levados em consideração na implantação dos sistemas de sustentabilidade ambientais como apresentado abaixo:
A realização das atividades de manutenção tem como objetivo a reconstrução de níveis de desempenho da edificação. Como apresentado na imagem abaixo, para se manter o desempenho do edifício é necessário analisar o nível e o grau de degradação, e sempre que possível mantê-lo no nível aceitável de acordo com a vida útil.
A partir de seu comportamento, analisado por um estudo apurado, pode-se prever o desempenho da edificação durante sua vida útil. Com isso, há possibilidade de sua gestão e sua manutenção, com sucesso. O intuito é manter um padrão de conservação da edificação.
A falta de recursos dos moradores de habitações populares, podem dificultar os resultados esperados, por isso, o controle de gastos com esses sistemas contribui para a minimização dos processos de deterioração destas edificações.
Veja também: Manutenção de condomínios: 5 dicas para executar e otimizar
Implantação de práticas sustentáveis em habitações populares
Todo projeto que adapta uma edificação de baixa renda deve ser visto como um processo. Sendo assim, a implantação da solução pode ser apresentada como fluxograma para facilitar a visualização e o planejamento das atividades.
Inicialmente recomenda-se que a solução pretendida esteja no topo, e a partir daí elabore-se a matriz para analisar as esferas da sustentabilidade e a relação com seu projeto.
O próximo passo é classificar sua edificação e discutir o tipo de medidas, estruturais ou não, para proceder a adaptação da residência. Com esses dados técnicos, o responsável conseguirá desenvolver as análises econômicas/financeiras de seu projeto.
Diante desses dados, por fim, já há elementos para a decisão de implantação ou não de sistemas que garantam a sustentabilidade das habitações populares e quais sistemas podem ser implantados. Este fluxograma pode ser desenvolvido desta forma:
Veja também: PCMAT: o que é, quando é exigido e como elaborar
A realização de projetos sustentáveis de forma amadora pode levar a consequências sérias para a saúde e a segurança da população.
A sustentabilidade e inovação na habitação popular deve ser vista de maneira técnica e com as devidas análises das esferas ambiental e econômica. Um planejamento correto e bem estudado, trará o equilíbrio necessário para a sustentabilidade econômica e ambiental. Com isso, os recursos naturais serão utilizados de forma eficiente e as edificações mais sustentáveis.
Gostou do artigo? Acompanhe minhas próximas publicações acessando o meu perfil no Portal Serviço em Destaque.