Na climatização de data center esse cenário pode ser bem conhecido: o telefone toca, normalmente no sábado à noite ou no domingo à tarde. É alguém da equipe de TI. O data center alarmou por temperatura e a transmissão de dados está comprometida. O problema já foi informado a algum diretor e a partir de agora a sua cabeça está a prêmio.
Um problema que não deveria existir acabou de ocorrer, a temperatura sobe exponencialmente e em poucos minutos os racks estão fervendo, o data center só não está mais quente que a sua cabeça ao perceber que várias contingências falharam.
Uma característica comum a todo desastre é a simultaneidade de falhas. Ah se o Titanic estivesse um pouco mais devagar, se os vigias estivessem com binóculos, se o aviso de socorro fosse respondido e se houvessem botes salva vidas para todos.
Para que você não tenha que passar por uma situação semelhante a essa, neste artigo compartilho tudo que consultei em livros e publicações sobre climatização de data center e o que vejo o mercado executar. Dos desastres às boas práticas, dividirei experiências sobre pontos chaves do projeto, execução e operação da refrigeração de data center. Práticas simples que podem (e provavelmente vão) salvar seu final de semana.
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Tipos de ar condicionado para data center
O tipo de ar condicionado ideal para a climatização de um data center, é o de precisão. O motivo é simples, são máquinas com controles mais sofisticados e com capacidade de resposta mais adequadas às cargas térmicas geradas por equipamentos elétricos.
Uma comparação direta com ares-condicionados mais tradicionais, que visam o conforto térmico, pode ajudar a entender as diferenças:
Precisão | Conforto | |
Aplicação | Utilizado para altas densidades de carga térmicas | Destinado ao conforto térmico humano. |
Tempo de operação | Projetados para utilização 24 horas, 07 dias por semana. | Projetado para utilização intercalada, com intervalos de horas entre os acionamentos. |
Controles | Automação de resposta rápida, com eletrônica embarcada. | Controles do tipo On Off, similares a geladeiras e demais eletrodomésticos |
Troca térmica | Projetados para trocas térmicas de até 20°C. (ou seja, caso o ar entre a 30°C ele sairá a 10°C) | Projetados para trocas térmicas de até 12°C (ou seja, caso o ar entre a 30°C ele sairá a 18°C) |
Mas mesmo com tamanha diferença de concepção, o ar condicionado de conforto ainda é muito utilizado em data centers. Por quê?
Simples, o preço. Equipamentos de precisão chegam a custar facilmente dezenas de milhares de reais. Não é incomum, inclusive, que o valor de um desses equipamentos seja equivalente à uma reforma completa de um andar comercial. Diante da recusa do cliente em comprá-los, nos resta adaptar a operação de equipamentos de conforto em ambientes de data centers. Abaixo algumas regras gerais para que isto ocorra:
- Que seja de boa qualidade (por conta da vida útil);
- Tenha tecnologia INVERTER, o que lhe dará respostas rápidas e mais precisas as variações de temperatura;
- Tenha redundância (na alimentação elétrica e do equipamento);
- Seja de capacidade superior à somatória das cargas térmicas contabilizadas no ambiente.
Leia também: Como a manutenção preditiva evita paradas inesperadas de equipamentos?
Cálculo de ar condicionado para data center
A conta que dimensiona a potência do equipamento de climatização de um data center não é muito difícil. Para cada 01 W (Watt) de carga elétrica do equipamento de TI é necessário 01 W (Watt) de potência térmica do equipamento de refrigeração.
Presença humana, ventilação, infiltração, insolação, material construtivo, posição geográfica e periféricos como iluminação e equipamentos auxiliares também entram nesta conta. E embora o cálculo não seja difícil, pode ser bem longo.
Assim como a população mundial, a taxa de ocupação de racks dentro do espaço físico do data center sempre aumenta, o que não aumenta é a capacidade do equipamento de ar condicionado, que depois de instalado tem a missão de atender toda e qualquer carga térmica que entrar porta adentro.
O que proponho? Ainda em projeto verifique se um fator de 70% de segurança foi adicionado ao cálculo. Esse é o valor recomendado por diversas literaturas e que vai lhe garantir estabilidade antes da inevitável adição de novos equipamentos.
Outra dica, os tópicos abaixo apresentam valores de densidade de carga por metro quadrado para diversas ocupações racks de TI, caso o seu esteja abaixo dos valores, fique atento;
- Baixa – 440 W/m²;
- Moderada – 660 W/m²;
- Alta – 1100 W/m²;
- Altíssima – 1.650 W/m².
É bom lembrar que cada instalação tem uma característica, mas similaridades podem ser encontradas. Projetar de forma futura pode não ser barato no presente, mas economiza no longo prazo.
Leia também: Qualidade de energia elétrica: qual impacto no ar condicionado?
Estratégias para climatização de data center: ter aparelhos reserva é uma boa solução?
Imagine uma empresa de logística que planeja transportar uma carga muito valiosa, tão valiosa que para mitigar a hipótese da quebra do caminhão tem à disposição um segundo veículo que fica em stand by, pronto para partir.
Carga acomodada, endereço de entrega confirmado, estamos prontos para partir? Não! Por que não? A única via disponível ao destino está bloqueada, a duplicidade de equipamentos não adiantou de nada.
Parece uma hipótese boba, mas é exatamente o que ocorre nas instalações de climatização de data centers com equipamentos em stand by. Muitas vezes os aparelhos estão ligados à mesma alimentação elétrica, aos mesmos circuitos ou pior, aos mesmos componentes do quadro elétrico.
Para instalações em série, ou seja, aquelas em que se seleciona um ou outro equipamento para operar, é saudável que estes não dividam componentes (que irão falhar). Verifique em sua instalação componentes comuns aos dois equipamentos (disjuntores, contatores e timers são bons exemplos) há uma enorme chance de serem eles os vilões de uma pane, então merecem testes extras nas inspeções.
Evitando falhas na refrigeração de data center: operação em paralelo
A operação em paralelo é um conceito simples, mas muito eficiente. Ao invés de acionar o equipamento “B” apenas quando o equipamento “A” falhar, porque não deixá-los trabalhando de forma conjunta, onde ambos absorvem cargas parciais?
Equipamentos de conforto mais modernos utilizam de uma tecnologia chamada INVERTER, que nada mais é do que a variação da rotação do compressor mediante a necessidade de aumento ou diminuição da capacidade de refrigeração. Equipamentos dessa classe demonstram muitas vantagens:
- A temperatura no ambiente tende a ser mais constante, já que o compressor funciona em rotação variável e contínua;
- Maior estabilidade, menor nível de ruído;
- Menor consumo elétrico, já que não ocorre a “corrente de partida”, um pico energético provocado pela quebra da inércia do motor;
- Até 40% de economia em relação aos aparelhos convencionais.
Comparação de operação convencional ao INVERTER
Obviamente o monitoramento da operação desses equipamentos é necessária, para que não ocorra uma falsa divisão de carga, cenário em que apenas um refrigera e o outro apenas ventila.
Outra vantagem da operação em paralelo em sistemas de climatização de data center, é a certeza de que ambos os equipamentos funcionam. Afinal, é comum termos a desagradável surpresa de ligarmos um equipamento que ficou em standby por muito tempo e descobrirmos que algo está errado, mas como ele não era utilizado, não percebemos.
O que levar em conta sobre a operação de um equipamento de data center para a criação de um projeto de climatização
Você certamente já utilizou seu celular em um ambiente externo, sob um sol escaldante ou uma chuva torrencial e o aparelho sobreviveu. Porém, você faria o mesmo com uma TV? Certamente não. Apesar de serem eletroeletrônicos similares temos a consciência que uma TV não foi feita para uso nas mesmas condições que um celular.
Assim como qualquer equipamento os de TI são divididos em criticidade e faixas recomendadas de operação, são elas;
- A1 – Missão crítica de grande tráfego (bancos, e-commerce e nuvens);
- A2 – Servidores, armazenamento de dados (drives) e computadores pessoais de grande capacidade;
- A3/A4 – Servidores de baixo volume de dados, armazenamento de dados (drives) e computadores pessoais.
Com essa classificação em mente, observe a figura abaixo. São as projeções de temperatura (horizontal) e umidade (vertical /transversal) para as classificações citadas acima. Há também uma área vermelha central que é a faixa de operação recomendada para qualquer equipamento eletroeletrônico.
ASHRAE’s Thermal Guidelines for Data Processing Environments
Observando os equipamentos de nível A3/A4 percebemos que seu envelope de operações abrange, no mínimo, algo em torno dos 5°C a 40°C e 10% a 90%, são 35°C e 80% de range de temperatura e umidade relativa, respectivamente. Equipamentos de alívio térmico, como os resfriadores evaporativos trabalham dentro das faixas de operação dos níveis A3/A4 e funcionam através da troca de calor proveniente do contato entre ar e água, por isso não poderiam ser mais simples e certamente podem te salvar na hora do aperto.
Outro fator importante, 40°C é superior a qualquer temperatura máxima externa registrada no Brasil, o que nos dá um gancho para o nosso próximo item.
Leia também: Qual o fator que pode aumentar a conta de energia de uma empresa?
Importância da ventilação na climatização de data centers
Aqui a dica é: se não puder refrigerar, resfrie! Isso porque, a troca de calor está baseada em um conceito simples: a diferença de temperatura, que é a lei zero da termodinâmica. Outros fatores como as características térmicas, vazão, massa e densidade são importantes, porém sem a diferença de temperatura tudo se perde. É o que os professores de cursinhos chamam de “Que macete”:
Q= m*c*∆t
Em que:
- Q é a quantidade de calor trocada;
- m é a massa do material que troca calor;
- c é a característica térmica do material;
- ∆t é a diferença de temperatura.
Tendo a presença de algum fluido, sólido ou gás o que nos daria a massa (m) e a característica térmica (c), nos sobra apenas a diferença de temperatura (∆t) para que algum calor seja trocado (Q).
Com esse princípio em mente podemos projetar um dispositivo de ventilação que emergencialmente pode suprir a troca térmica quando o equipamento de climatização estiver em pane, vamos ao exemplo.
Para um data center de categoria A3 de 5 kW de equipamentos instalados na cidade de São Paulo, deseja-se saber qual a vazão de ar necessária para mantê-lo funcionando. (dentro dos padrões aceitáveis da ASHRAE’s Thermal Guidelines).
Vamos tabelar o que temos:
Q | 5 kW | transformando | 18.000 kJ/h |
m | Incógnita | ||
c | 1,0 | kJ /KgK | |
∆t | – 32) °C * |
*40°C é o limite de temperatura da ASHRAE e 32°C é a temperatura máxima de referência da NBR 16401- 2008, para a cidade de São Paulo -SP.
Ficando a equação:
18.000= m*1,0*(40-32)
Resultando em 2.250 Kg/h de ar, convertendo a uma vazão volumétrica, utilizando o volume específico do ar de 0,816 m3/kg resulta em 1.836 m3/h. Com essa vazão mesmo na pior situação externa o equipamento se manterá funcionando, dentro do limite aceitável.
É importante ressaltar que em uma instalação baseada em ventilação não há retorno do ar ao equipamento de ventilação, sendo assim uma saída (exaustão) para o ar deve ser “criada”, o que não é muito difícil pois uma porta aberta proverá esse caminho ao ambiente externo.
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Antecipação das falhas
Certa vez assistindo um vídeo sobre aviação, vi um piloto defender que a melhor aeronave é a monomotor (a de apenas um motor), o motivo é simples, segundo o piloto, com dois motores há duas vezes mais chances de problemas, já ouvi também a frase de um antigo general que teorizou “…nenhum plano de batalha sobrevive ao contato com o inimigo“.
Há de fato um tom pessimista nas afirmações, o primeiro não confia na instalação, já que quanto mais equipamentos, pior será e o segundo não confia no projeto, já que o planejado não funciona. Apesar de não concordar completamente, tenho que lhes dar certa razão. Não podemos confiar cegamente no projeto nem na instalação, devemos confiar na equipe e no trabalho contínuo.
O fator humano é, certamente, o mais importante deste documento já que ele fará toda a diferença no momento de necessidade. O tempo gasto com treinamento e manutenção preventiva nunca é perdido e monitorar um equipamento é essencial, já que sabemos que ele falhará. Os treinamentos devem ser feitos em campo, com simulações que vão muito além do passo a passo fixado na parede.
Planos de manutenção devem ser gerados e seus dados analisados. Afinal, antes do resfriado sempre há um mal estar, assim como antes da quebra sempre há um ruído ou vazamento. Os sinais existem, porém temos que estar preparados para identificá-los.
São as pessoas que irão resolver os problemas e é nelas que o maior investimento deve ser feito.
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